sexta-feira, 18 de março de 2011

Dza Patrül Rinpoche, orgyen jigme chökyi wangpo · Biografia

dza patrül rinpoche, orgyen jigme chökyi wangpo · biografia

Externamente, ele é o bodhisattva Shantideva;
Internamente, ele é o mahasiddha Shavaripa;
Secretamente, ele é a Liberação Espontânea do Sofrimento [Avalokiteshvara] —
Rogo a Jigme Chökyi Wangpo, Destemido Senhor do Dharma.

Patrül Rinpoche (1808-1887), Orgyen Jigme Chökyi Wangpo, é a emanação da fala de Jigme Lingpa. Foi um dos grandes professores e escritores nyingmapas, cuja vida e ensinamentos são citados até mesmo por eruditos de outras escolas. Apesar de ter sido um dos maiores eruditos e adeptos da escola Nyingma, Patrül Rinpoche viveu como um eremita muito humilde e simples. Falava diretamente e em voz alta, mas cada palavra sua era a palavra da verdade, da sabedoria e do cuidado.

Patrül Rinpoche nasceu na tribo Getse Kongma da linhagem Mugpo Dong, em Karchung Ko'ö no vale Dzachukha, no ano do dragão da terra do décimo quarto Rabjung (1808). Seu pai era Lhawang do grupo Gyalthog e sua mãe era Drölma do grupo Tromza. Pouco tempo depois do seu nascimento, Patrül Rinpoche tentou dizer Om, mas não estava claro. Entretanto, no quinto dia ele disse Om Mani Padme Hum muito claramente. As letras do mantra Om Mani Padme Hum também estavam visíveis em seu pescoço, assim como uma letra Hrih sobre sua língua.

Apesar de ser um tülku de Jigme Lingpa, oficialmente ele foi reconhecido como o tülku de Palge Samten P'hüntsog por Dola Jigme Kalzang. Confirmando o reconhecimento, o primeiro Dodrubchen disse a Jigme Kalzang: "Estou concedendo a transmissão da mente e a transmissão aspiracional dos ensinamentos completos do Longchen Nyingthig sobre ele com o nome Orgyen Jigme Chökyi Wangpo." Pouco tempo depois, Palge Künchog — um sobrinho do último Palge — levou Patrül Rinpoche a Palge Ladrang, a residência do último Palge.

Patrül Rinpoche estudou os ensinamentos dos sutras e dos tantras com muitos mestres, incluindo Dola Jigme Kalzang, Jigme Ngotsar, Gyalse Shenp'hen Thaye, Sönam Palgye e Shechen Thutob Namgyal. Sengtrug Pema Tashi do monastério Dzogchen ordenou-o como monge. Entretanto, seus lamas-raiz foram Jigme Gyalse Nyugu e Do Khyentse. Com Jigme Gyalwe Nyugu, estudou desde o Ngöndro — o treinamento preliminar — até os ensinamentos sobre Tsalung e Dzogpachenpo. De Gyalwe Nyugu, recebeu ensinamentos do Longchen Nyingthig Ngöndro vinte e cinco vezes e fez tantos quantos treinamentos sobre eles. Mais tarde, escreveu as palavras de seu professor sobre o Ngöndro como o famoso texto Künzang Lame Shelung (Palavras da Boca do Lama Samantabhadra, ou Palavras de Meu Professor Perfeito).

Um dia, Do Khyentse — que estava vagando enquanto fazia exercícios esotéricos — apareceu subitamente do lado de fora da tenda de Patrül Rinpoche. Do Khyentse gritou, "Oh Palge! Se você for bravo, venha aqui fora!" Quando Patrül Rinpoche respeitosamente saiu, Do Khyentse agarrou-o pelo cabelo, jogou-o no chão e o arrastou ao redor dele. Naquele momento, Patrül Rinpoche sentiu cheiro de álcool na respiração de Do Khyentse e pensou, "O Buddha expôs os perigos do álcool, porém até mesmo um grande adepto como ele pode ficar bêbado assim." Nesse instante, Do Khyentse soltou Patrül Rinpoche e gritou, "Alas, como vocês intelectuais poderiam ter esses pensamentos maléficos! Seu Cachorro Velho!" Do Khyentse deu uma palmada em sua face, mostrando-lhe seu dedo mínimo (um gesto de insulto) e partiu.

Patrül Rinpoche realizou, "Oh, estou deludido. Ele estava realizando um exercício esotérico para me introduzir à minha natureza iluminada." Patrül Rinpoche ficou dividido por dois sentimentos conflitantes: de choque com seus próprios pensamentos negativos e de maravilhamento com a clarividência de Do Khyentse. Sentando-se, Patrül Rinpoche meditou imediatamente sobre a natureza iluminada de sua mente e nele despertou um estado desperto intrínseco, claro, aberto, como o céu. A partir de então, nele despertou uma realização clara e total como um sol nascente, acima da realização semelhante a um amanhecer que já tinha tido como resultado da introdução que recebeu de Gyalwe Nyugu. Desde então, Patrül Rinpoche brincalhonamente manteve "Cachorro Velho" como seu nome esotérico ou sagrado.

Quando Patrül Rinpoche tinha por volta dos vinte anos, Palge Könchog — o administrador chefe do Palge Ladrang — morreu. Patrül Rinpoche fechou a residência de Palge e começou a viver como um eremita errante.

No monastério Dzogchen, recebeu as transmissões doNyingthig Yabshi e o Longchen Nyingthig do quarto Dzogchen Rinpoche e de Gyalse Shenp'hen Thaye. Então, meditou em longos retiros na caverna Shinje e na caverna Tsering — próximas ao monastério Dzogchen —, onde uma vez Dodrubchen fez seu retiro de anos. Por volta de 1851, do grande erudito Gyalwa Dongag Gyatso — um discípulo tanto de Patrül Rinpoche quanto de Shabkar Tsogdrug Randröl (1781-1851) —, Patrül Rinpoche ouviu detalhes da vida altamente inspiradora de Shabkar. Quando chegou a Golok em seu caminho para ver Shabkar, Patrül Rinpoche ouviu as tristes notícias de que Shabkar tinha acabado de morrer. Patrül Rinpoche voltou e foi para Yarlung Pemakö, a sede de Dodrubchen. Em Yarlung, juntou-se a Gyalse Shenp'hen Thaye (1800-?), que estava vivendo como regente do último Dodrubchen e estava começando os quarenta e cinco dias de ensinamento e prática anuais do Guhyagarbha Mayajala Tantra. Patrül Rinpoche recebeu ensinamentos de Gyalse sobre o Guhyagarbha Tantra e agiu como seu assistente de ensinamento no primeiro ano. O próprio Patrül Rinpoche então presidiu sobre os ensinamentos anuais por mais dois anos.

Patrül Rinpoche foi para os vales Ser, Do, Mar e Dzika. Em numerosas vezes deu ensinamentos sobre oBodhicharyavatara e inspirou toda a população a recitar Om Mani Padme Hum. Nessas áreas, teve grande extensão de sucesso em abolir o sistema de servir carne aos lamas quando viessem realizar serviços rituais. Proclamou regras contra roubar e caçar. Levou o buddhismo na vida de todos e em todas os lares, de modo que não ficasse limitado aos monges, monastérios e gompas.

Patrül Rinpoche visitou o monastério Shugchung e então, durante um longo período de tempo, permaneceu em Shugchen Tago, a residência formal do primeiro Dodrubchen. Apesar de Dodrubchen ter abandonado a residência cerca de meio século antes, ela ainda estava funcionando como um eremitério. Patrül Rinpoche recitou o Kangyurtrês vezes e memorizou muitos sutras.

Então Patrül Rinpoche viveu aos pés de uma árvore em Ari Nag (também conhecido como Dhichung P'hug) durante um longo tempo. Era um elevado campo aberto no meio de uma floresta densa. Ninguém nunca tinha ido lá e as únicas pessoas que eventualmente pudessem vê-lo eram os viajantes do outro lado do vale Do, a cerca de meia milha de distância do rio Do. A floresta Ari é situada nas margens do rio Do, a meio caminho entre Shugchen Tago e o presente monastério de Dodrubchen.

Primeiro, Patrül Rinpoche e Nyoshül Lungtog [Tenpe Nyima, 1829-1901/2] — que viveu ao redor de Patrül Rinpoche e estudou com ele durante vinte e oito anos — permaneceram sozinhos na floresta Ari durante seis meses. Um pequeno saco de tsampa para comer, as roupas do corpo e alguns livros eram as suas posses. Ao meio dia, juntavam-se e comiam um pouco de tsampa. Então, amarravam o saco de tsampa em uma árvore e o deixavam lá até o dia seguinte. Depois disso, Patrül Rinpoche dava ensinamentos a Lungtog sobre alguns versos doBodhicharyavatara. Então, vestindo o trapo branco que era a sua única veste, com uma bengala em sua mão, Patrül Rinpoche desaparecia nas florestas, gritando em voz alta Ha! Ha! Ha! Ha! como um exercício de meditação. No dia seguinte, ao meio-dia, juntavam-se novamente e faziam a mesma coisa.

Em pouco tempo, muitos discípulos chegaram na floresta Ari e Patrül Rinpoche começou a ensinar o Semnyi Ngalso, o Yönten Dzö e outros ensinamentos. Patrül Rinpoche dava ensinamentos e então os discípulos meditavam na floresta. Como não estavam dando muita atenção aos seus arranjos de subsistência, eles tinham muito pouco para comer. Apesar de ser uma floresta densa, não havia vegetação comestível. No começo, o chá que bebiam era forte e saboroso quando o fizeram com folhas de chá frescas; mas depois adicionavam mais e mais água ao chá velho, de modo que este tinha menos e menos sabor e cor. Eles brincavam sobre as diferentes intensidades do chá, chamando-o "chá dos três kayas". O forte era o chá do elaborado Nirmanakaya, o fraco era o chá do simples Sambhogakaya, e o sem sabor era o chá da vacuidade do Dharmakaya. Patrül Rinpoche viu que as propriedades e as condições desejáveis — como ter uma abundância de comida, boas roupas, moradias confortáveis, cumprimentos e fama — são mais um obstáculo do que suporte no progresso espiritual. Ele escreveu:

O sofrimento é bom e a felicidade não é boa.
A felicidade inflama os cinco venenos da paixão.
O sofrimento exaure os karmas ruins acumulados no passado.
O sofrimento é a graça do lama.

A crítica é boa e os cumprimentos não são bons.
Se eu for cumprimentado, ficarei inflado com arrogância.
Se eu for criticado, minhas faltas serão expostas.

A pobreza é boa e a prosperidade não é boa.
A prosperidade causa os grandes sofrimentos do querer mais e do preservar.
A pobreza causa dedicação e a realização do Dharma divino.

Na floresta Ari, um dia Patrül Rinpoche perguntou a Lungtog, "Você se lembra de sua mãe?" Lungtog disse, "Não muito, senhor." Patrül Rinpoche disse, "É porque você não meditou sobre a compaixão. Agora vá naqueles salgueiros e medite sobre o 'reconhecimento da maternidade' e sobre a 'lembrança da bondade da mãe' durante sete dias." Lungtog meditou conforme Patrül Rinpoche tinha instruído e a bodhichitta da bondade amorosa e da compaixão naturalmente se desenvolveu nele, sem qualquer necessidade de esforços adicionais.

Em seguida, Patrül Rinpoche foi ao monastério Dzamthang, um grande centro dos estudos Jonang. Lá deu ensinamentos sobre o Uttaratantra baseados nas interpretações de Künkhyen Dölpo. Em Minyak, encontrou Dra Geshe Tsültrim Namgyal, um grande erudito gelugpa que ficou maravilhado com a erudição de Patrül Rinpoche. No monastério Gyap'hag, deu iniciações e ensinamentos de todo o Longchen Nyingthig, que dava muito raramente. Em Golok, domou ladrões selvagens e caçadores cruéis com o poder de sua presença e das palavras da razão. Em Marung, ensinou as pessoas a repetir as palavras da compaixão, Om Mani Padme Hum, pois nem mesmo sabiam como pronunciá-las. Então retornou à floresta Ari do vale Do e permaneceu lá durante algum tempo.

Em 1856/7, Patrül Rinpoche ouviu que Do Khyentse tinha chegado nas montanhas Yutse e Golok a partir do Tartsedo. Patrül Rinpoche foi até lá — uma distância de muitos dias de viagem — para ver Do Khyentse. Patrül Rinpoche pediu que Do Khyentse lhe desse a iniciação de Yumka Dechen Gyalmo do Longchen Nyingthig. Do Khyentse disse, "Tenho a mantido em segredo durante muitos anos, mas agora vou conferi-la sobre você." Com grande alegria, Do Khyentse a transmitiu a Patrül Rinpoche. Entre as muitas profecias dadas por Do Khyentse, estava uma de que Patrül Rinpoche viveria até a idade de oitenta. Então Do Khyentse, o segundo Dodrubchen e Patrül Rinpoche realizaram juntos uma cerimônia cantada, que se tornou um sinal de que renasceriam como irmãos. Patrül Rinpoche retornou ao vale Do e deu ensinamentos sobre o Bodhicharyavatara em muitos lugares.

Depois de viver cerca de dez anos pelos vales Do e Ser, ao redor das sedes de Dodrubchen, Patrül Rinpoche retornou ao monastério Dzogchen. Em Peme Thang, nos eremitérios Nagchung e no colégio Shrisimha do monastério Dzogchen, ensinou o Bodhicharyavatara, oAbhisamayalamkara, o Madhyamakavatara, oMahayanasutralamkara, o Abhidharmakosha, o Guhyagarbha Mayajala Tantra, o Yönten Dzö, o Domsum Namge e muitos outros textos durante alguns anos.

Nyoshül Lungtog Tenpe Nyima permaneceu com Patrül Rinpoche no eremitério Nagchung, próximo ao monastério Dzogchen. Todos os dias, ao pôr-do-sol, Patrül Rinpoche fazia uma seção de meditação sobre o treinamento doNamkha Sumtrug, esticado de costas sobre um carpete novo de lã em um pedaço de campo coberto com capim. Em uma noite, enquanto estava deitado lá como de costume, Patrül Rinpoche perguntou a Lungtog, "Lungche [Caro Lung]! Você disse que não conhece a verdadeira natureza da mente?" Lungtog respondeu, "Sim senhor, eu não a conheço." Patrül Rinpoche disse, "Oh, nada há a não se conhecer. Venha aqui." Então, Lungtog foi até ele. Patrül Rinpoche disse, "Deite-se, assim como eu estou deitado, e olhe para o céu." Quando Lungtog fez isso, a conversação continuou assim:

"Você vê as estrelas no céu?"

"Sim."

"Você ouve os cachorros latindo no monastério Dzogchen [a uma longa distância]?"

"Sim."

"Bem, isso é a meditação."

Naquele momento, Lungtog atingiu confiança na realização em si. Tinha sido liberado dos grilhões conceituais do "é" ou "não é". Tinha realizado a sabedoria primordial, a união nua de vacuidade e estado desperto intrínseco, a mente de Buddha.

Patrül Rinpoche foi a Kathok em peregrinação e deu ensinamentos sobre o Bodhicharyavatara. Encontrou o Tertön Chogyur Lingpa no monastério Dzogchen e recebeu transmissões. Finalmente, retornou a Dzachukha, sua região natal. Visitou quase todos os monastérios e eremitérios no vale Dzachukha, especialmente os eremitérios Gekong e Changma, e ensinou o Bodhicharyavatara e outros textos da filosofia Mahayana. Mas na maioria da última parte de sua vida, Patrül Rinpoche viveu ao redor de Dzagya Gön — a sede de seu lama-raiz Gyalwe Nyugu —, onde os restos de Gyalwe Nyugu permanecem santificados em um relicário. Em Dzagya, estabeleceu os três meses de ensinamento e prática anuais do Bodhicharyavatara, e uma semana de ensinamento e prática sobre a terra pura de Amitabha, o Buddha da Luz Infinita. Quando quer que entrasse no santuário onde os restos de seu professor estão preservados em um relicário, Patrül Rinpoche sempre dizia as seguintes aspirações em voz alta:

Em todas as nossas vidas sucessivas, possamos nunca ser influenciados por quaisquer amigos maus. Em todas as nossas vidas sucessivas, possamos nunca violar nem mesmo um único fio de cabelo dos outros. Em todas as nossas vidas sucessivas, possamos nunca estar separados da luz do Dharma. [Seguido por um verso das escrituras:]

Para quem quer que receba estes ensinamentos de mim e
Até mesmo quem me veja, me ouça, que pense em mim ou se relacione comigo em conversas —
Possa a porta de seu renascimento nos reinos inferiores ser selada
E possa renascer na suprema terra pura de Potala.

No Mamo Dö em Dzachukha, Patrül Rinpoche dedicou muitos anos de esforço para expandir um famoso Dobum, um complexo impressionantemente grande de muros de pedras — e sobre cada pedra, o mantra Om Mani Padme Hum está entalhado muitas vezes. Este muro foi iniciado pelo predecessor de Patrül Rinpoche. Pela primeira vez, Patrül Rinpoche começou a aceitar as oferendas dadas a ele e usava cada pedaço de manteiga como pagamento para as pessoas que estavam ocupadas em entalhar as preces. Quando o muro de pedra foi completado, Patrül Rinpoche enviou um mensageiro a Khyentse Wangpo para pedir que o consagrasse. Nesse dia em particular, grãos de consagração abençoados — jogados por Khyentse Wangpo a uma distância de oito dias de viagem a cavalo — chegaram ao muro de pedra diante dos olhos de todos.

Em Tramalung, ensinou e conduziu a prática de treinamentos preliminares únicos, Trekchö e Thögal. Depois, seu discípulo chefe — Tendzin Norbu (Tenli) — observou, "Antes eu tinha algum entendimento da Grande Perfeição, mas em Tramalung atingi um completo entendimento e realização dele [graças aos ensinamentos e transmissões de Patrül Rinpoche]."

Por volta de 1872, o terceiro Dodrubchen — que estava com oito anos de idade — foi a Dzagya Gön para receber ensinamentos e transmissões de Patrül Rinpoche. Depois de seus ensinamentos, a pedido do próprio Patrül Rinpoche, Dodrubchen deu ensinamentos sobre o Bodhicharyavatara a uma grande reunião pública, que incluía o próprio Patrül Rinpoche. Então, Patrül Rinpoche enviou as boas notícias a Khyentse Wangpo dizendo, "Quanto ao Dharma do aprendizado, Dodrubchen deu ensinamentos sobre o Bodhicharyavatara com a idade de oito. Quanto ao Dharma da realização, Nyagla Pema Düdül [1816-1872] acabou de atingir o corpo de arco-íris. Então, a doutrina de Buddha ainda não foi diminuída."

Patrül Rinpoche era muito bondoso e respeitoso com Dodrubchen e o colocava sobre sua almofada durante seus ensinamentos. No início de uma manhã, Patrül Rinpoche ouviu que Dodrubchen estava chorando. Depois lhe disseram que Dodrubchen tinha cochilado durante suas preces matinais e que seu tutor tinha lhe dado uma surra. Patrül Rinpoche estava tão perturbado com o que o tutor fizera que ele disse a Dodrubchen, "Quando você morrer, não vá para Zangdok Palri [a terra pura de Guru Rinpoche], pois se você o fizer, Guru Rinpoche o enviará de volta porque ele está sempre preocupado com os tibetanos. Apenas vá para Dewachen [a terra pura de Amitabha] e não volte para estas pessoas."

Naquele tempo, Dodrubchen ouvia a voz de Patrül Rinpoche através das paredes de tempos de tempos, dizendo: "Grande senhor Padmasambhava, por favor olhe para mim. Não tenho mais ninguém de que depender..." — as palavras de invocação a Guru Rinpoche do texto Longchen Nyingthig Ngöndro. Isto indica que o Ngöndro deve ter sido uma de suas principais práticas.

A partir da idade de setenta e um, Patrül Rinpoche começou a guardar comida suficiente para cerca de uma semana, o que nunca tinha feito antes. Além disso, Patrül Rinpoche não aceitava oferendas — ou se aceitasse, enviava-as imediatamente como fundos para os construtores do muro de pedra. Às vezes, Patrül Rinpoche apenas deixava a comida no lugar onde foi oferecida, de modo que as pessoas pobres se acostumaram a segui-lo para coletar as oferendas que deixava para trás.

Com a idade de setenta e seis, no campo Dza Mamö, Patrül Rinpoche deu ensinamentos sobre a Prece de Aspiração da Terra Pura e sobre o Mani Kabum a cerca de mil pessoas. Depois disso, não deu mais quaisquer ensinamentos públicos. Quem quer que viesse vê-lo, Patrül Rinpoche enviava a Tendzin Norbu para que dele recebessem ensinamentos. Se as pessoas insistissem, ao invés disso Patrül Rinpoche iria ralhá-los; mas quanto mais Patrül Rinpoche ralhava as pessoas, mais se tornavam devotas a ele. Isso era por causa de seu coração compassivo e de suas palavras não-pretensiosas.

Aos setenta e sete, Patrül Rinpoche foi a Dzagya Gön, convidou o quinto Dzogchen Rinpoche — que estava visitando Dzachukha — e celebraram o décimo dia do mês do macaco do ano do macaco, o nascimento de Guru Rinpoche.

Na idade de setenta e oito, Patrül Rinpoche retornou a Ko'ö, seu lugar de nascimento. Na idade de oitenta, no décimo terceiro dia do quarto mês do ano do porco de fogo (1887), Patrül Rinpoche começou a ter problemas de saúde. No décimo oitavo dia do mês, tomou seu chá da manhã como de costume. Então, antes da tarde, sentou-se nu na postura de Buddha e colocou suas mãos sobre seus joelhos. Khenpo Künpal estava presente e tentou colocar as roupas de volta sobre Patrül Rinpoche, mas ele não reagiu. Depois de um tempo, com seus olhos abertos no olhar meditativo, Patrül Rinpoche estalou seus dedos uma vez, descansou suas mãos no gesto de contemplação e sua mente fundiu-se na pureza primordial. No vigésimo dia do mês, Tsamtrül Rinpoche realizou a cerimônia para despertar a mente de Patrül Rinpoche da absorção.

Em sua morte, nenhum material de qualquer valor foi deixado para trás. Havia um conjunto de mantos monásticos, uma tigela de esmolas, um manto amarelo, uma veste inferior, comida suficiente para cerca de dez dias, um conjunto de cinco textos de Asanga e uma cópia de Madhyamakavatara. Havia cinco moedas de prata e alguns poucos echarpes que Patrül Rinpoche ainda não tinha enviado como fundos para os construtores do muro de pedra. Isso é tudo que ele tinha.

O terceiro Dodrubchen descreve os ensinamentos de Patrül Rinpoche assim:

[Em] quaisquer ensinamentos que deu, ele nunca os apresentou com qualquer rastro de [querer] mostrar sua erudição, mas [sim com] a intenção de que eles se adaptassem ao entendimento dos ouvintes. Se seus ensinamentos forem analisados, eles são vistos como sendo lógicos e significativos. Se forem ouvidos até mesmo por uma pessoa tola, ainda sim são fáceis de compreender. Quando são condensados, são fáceis de entender. São do tamanho adequado, relacionados ao assunto, encantadores e saborosos.

Descrevendo a personalidade de Patrül Rinpoche, o terceiro Dodrubchen escreve:

Patrül usa palavras tenebrosas e esmagadoras, mas não há sinal de ódio ou apego nelas. Se você souber como ouvi-las, elas são, direta ou indiretamente, apenas ensinamentos. O quer quer que ele diga é como ouro sólido — é verdade. Trata todas as pessoas igualmente, sem elogiá-las em sua presença nem caluniá-las em sua ausência. Nunca finge ser alguma [outra] coisa ou alguma outra pessoa. Então todos, altos ou baixos, respeitam-no como um professor autêntico. Não é parcial com pessoas altas, nem tem qualquer desprezo por pessoas ordinárias. Quem quer que esteja envolvido em atividades não-virtuosas, a menos que a pessoa seja imutável, ele escava as faltas dessa pessoa de uma vez e as expõe. Ele louva e inspira as pessoas que estão seguindo uma vida espiritual. Parece difícil servi-lo, mas não importa o quão próximo você está dele — é impossível encontrar uma única instância de desonestidade, dúvida, instabilidade ou hipocrisia nele. É imutável em amizade, fácil e relaxante de ser estar [com ele]. Tem paciência tanto com acontecimentos bons quanto ruins. É difícil de se separar dele. Apesar de ter permanecido como um praticante oculto durante toda a sua vida, ele era beneficente de todos os pontos de vista, pois nunca se desviou das atividades do bodhisattva. Como diz um provérbio: "Mesmo se o ouro permanecer sob a terra, sua luz irradia-se no céu." Na mesma extensão em que você o examina, você o acha claro e puro. Na mesma extensão em que você pensa sobre ele, sua fé nele aumenta.

Descrevendo a aparência física de Patrül Rinpoche, o terceiro Dodrubchen escreve:

Sua cabeça é larga como um pára-sol. Sua face é como um lótus desabrochando e suas faculdades sensoriais são imaculadamente claras. Geralmente tinha muito poucas doenças. Desde a infância, tem sido dotado com grande sabedoria e compaixão e é um orador brilhante.

Khenpo Künpal, que esteve com Patrül Rinpoche durante muitos anos do fim de sua vida, escreve que uma de suas principais preces era o Manjushrinamasangiti. Patrül Rinpoche não apenas não tinha posses mundanas, mas também não tinha muitos livros religiosos — o que se pensa ser o mais importante para um professor erudito. Às vezes tinha uma cópia do Bodhicharyavatara e do Manjushrinamasangiti, que eram suas preces diárias. Mas, às vezes, até mesmo estes livros ele dava a alguém, pois Patrül Rinpoche sabia os textos de cor. Não tinha papel nem uma caneta de bambu. Então, onde quer que estivesse, quando se levantava já estava pronto para deixar o lugar instantaneamente.

Patrül Rinpoche deu ensinamentos sobre textos filosóficos do sutra, do tantra e da Grande Perfeição, e despertou ou transmitiu a realização última às mentes de muitos discípulos afortunados. Entretanto, parece que Patrül Rinpoche deu iniciações ou realizou cerimônias elaboradas em apenas muito poucas ocasiões.

Patrül Rinpoche era não-sectarista em seu ensinamentos, escrituras e práticas. Estudou, praticou e ensinou as tradições buddhistas completas do Tibet. Viu os mestres de diferentes escolas igualmente como o Buddha da Sabedoria:

Senhor Sakya Pandita, que trouxe os cinco conhecimentos,
Senhor Tsongkhapa, a fonte dos ensinamentos do sutra e do tantra, e
Longchen Rabjam, mestre dos ensinamentos completos do Buddha
São os verdadeiros Manjushris da Terra da Neve [Tibet].

Uma pessoa de grande humildade e simplicidade, ainda assim era hábil para acomodar muitos eruditos nobres, ricos, poderosos e famosos como seus discípulos. Muitos discípulos em vestes de brocado, rodeados por hostes de séqüitos, vinham aos pés deste habitante solitário com roupas velhas, esfarrapadas e remendadas, que dificilmente tinha tsampa suficiente para comer ou combustível para aquecer chá. Até mesmo havia ocasiões em que sua humildade envergonhava as pessoas envoltas em brocado cavalgando cavalos, e Patrül Rinpoche expunha suas fraquezas.

Uma vez, Patrül Rinpoche viajou através de um campo nômade a pé, como de costume. Parou em uma família com uma grande tenda e perguntou se poderiam deixá-lo descansar durante alguns dias, pois estava exausto. A família perguntou, "Você pode ler preces?" Patrül Rinpoche respondeu, "Um pouco." Então, eles permitiram alegremente que Patrül Rinpoche entrasse e o deixaram se instalar no canto inferior da tenda. Muitas pessoas estavam ocupadas fazendo objetos rituais, colocando tendas, construindo assentos altos e cozinhando comida para um grande lama e sua comitiva, que estavam vindo para realizar uma cerimônia importante. Depois de alguns dias, ouviram que o grande lama estava chegando e todos correram para recebê-lo. Patrül Rinpoche não saiu. As pessoas gritaram com ele e quase o arrastaram para que se apresentasse diante do lama.

O lama, vestido em brocado, saiu com toda pompa de quase quarenta cavaleiros em comitiva, segurando estandartes em suas mãos como se fosse em um jogo. Patrül Rinpoche não teve escolha a não ser ir diante do grande lama, então ele o fez. Quando o grande lama viu Patrül Rinpoche, ele pulou do seu cavalo e caiu aos pés do mestre, envergonhado com sua pomposa exibição insignificante diante da presença significativa e humilde do grande Patrül Rinpoche. O lama era Minyag Künzang Sönam, um discípulo de Patrül Rinpoche que escreveu um comentário famoso sobre o Bodhicharyavatara. A partir daquele dia, o lama renunciou ao seu modo de vida pomposo, tornou-se um eremita e nunca mais andou a cavalo novamente, mas sim caminhava quando quer que viajasse por aí. As pessoas acreditaram que Patrül Rinpoche tinha previsto a chegada deste encontro através de sua clarividência, uma habilidade que tinha mostrado muitas vezes.

Seus escritos estão agrupados em seis volumes, sobre Dzogpachenpo, sutra, conselhos, poesia e drama. Seus trabalhos mais conhecidos são as instruções elaboradas sobre as práticas preliminares do Longchen Nyingthig, intituladas Palavras da Boca do Lama Samantabhadra[Palavras do Meu Professor Perfeito, tib. Künzang Lame Shelung]; uma instrução curta porém maravilhosa sobre a meditação da Grande Perfeição, intitulada As Três Palavras que Golpeiam os Pontos Cruciais[tib. Tsigsum Nedeg] e um comentário sobre o Abhisamayalamkara.

No Tibet Oriental, Patrül Rinpoche talvez tenha sido o mais instrumental de todos em fazer o Bodhicharyavatara (O Caminho do Treinamento do Bodhisattva) ser um manual para muitos monges; em fazer a Prece Aspiracional para Renascer na Terra Pura Extática de Amitabha ser uma prece diária para muitos leigos; em fazer oGuhyagarbha Mayajala Tantra ser o fundamento da tradição tântrica Nyingma; em fazer os ensinamentos Dzogchen serem não apenas uma tradição textual, mas uma realização meditativa; e, acima de tudo, em fazer o Om Mani Padme Hum ser a respiração perpétua de muitas pessoas.

Entre suas emanações estiverem Jigme Wangpo de Dzagya Gön e Namkha Jigme Dzachukha, um filho de Düdjom Lingpa.

Fonte: http://www.dharmanet.com.br/khyentse/biopatrul.htm

Adaptado de Tulku Thöndup, Masters of meditation and miracles:
Lives of the great Buddhist masters of India and Tibet
.
Editado por Harold Talbott. Boston: Shambhala, 1999. Pág. 201-210.

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